De férias em S. Jorge e
passeando à beira-mar numa noite de verão ouvem-se ao longe fortes
mugidos…
Mugidos de desespero e
estrondos metálicos fazem-nos percorrer um caminho que termina no
porto desta ilha. Entramos por um grande portão lateral e mesmo
junto deste, encontramos o que não queríamos: três contentores de
transporte marítimo apinhados de bovinos, um cheio de bezerros e os
outros dois de vacas.
Não cabia nem mais um!
Uns fardos de palha colocados numas prateleiras superiores às quais
só chegavam as vacas que por sorte (dentro daquele grande azar)
tinham ficado daquele lado do contentor, não havia água para beber
e muito menos espaço para deitar. Já para não falar dos seus
próprios excrementos. Basicamente, as vacas são transportadas numa
grande casa de banho!
É sufocante ver uma
coisa assim, mas mais sufocante ainda, é ganhar consciência de que
estas crueldades são feitas por humanos.
Olhavam para nós com um
misto de medo e de “tirem-me daqui!”. Uma cena da 2ª Guerra
Mundial e do transporte de Judeus para os campos de concentração
espelhavam-se aqui e agora… só mudam os personagens de animais
humanos para animais não humanos.
Voamos para o posto da
GNR e a partir daqui começa a dança, a dança do poder, da
insensibilidade, do julgamento, da desresponsabilização, do
monopólio, do lobby…
O Guarda da GNR era
simpático e não achava mal… afinal, foi sempre assim e são só
animais! Acompanhou-nos até ao local e minutos depois chega o
Veterinário num jipe da Secretaria Regional da Agricultura e
Florestas. É muito mais interessante cometer crueldades e
ilegalidades usando um carro da Secretaria Regional, pago com os
impostos dos portugueses, do que utilizar o seu próprio carro! Bem
como, receber um salário para assinar autorizações de transporte
ilícitas, também este pago com os impostos dos portugueses. E mais,
às tantas aquela deslocação em horário pós – laboral também
vai ser paga com os impostos dos portugueses! O Srº Veterinário,
ilustre figura da terra, já vinha a ferver, com certeza porque sabe
que de acordo com o DL nº 265/ 2007 de 24 Julho, ele é um dos três
responsáveis por esta situação, a qual é punível por lei. São
responsáveis pelo transporte de animais as várias empresas,
terrestre e marítima, os organizadores e os detentores de animais.
Vai daí que a troca de palavras com este senhor começa com
“Acordaram cedo hoje!”. Daqui nada resultou, apenas serviu para
recordarmos algo que já sabíamos: o transporte de animais é feito
desta forma em todas as ilhas há anos! Encurtamos a conversa porque
desenhava-se no ar um punho em riste.
Tomados por um grande
sentimento de impotência regressamos ao posto da GNR para apresentar
queixa. O Guarda simpático confessa que não sabe imprimir
formulários a partir do seu computador e por azar, naquela malfadada
noite, não havia nem um para nós!
Aquela foi a primeira
noite de inferno para aquelas vacas, ainda as esperavam mais oito em
alto-mar...
Maria João Martins